Ficar sozinha em casa em um fria tarde de sábado, nublada e silenciosa, não era o plano que tinha em mente, ficar só não é vantajoso quando se ouve demais. Para ela o "ouvir demais" não quer dizer segredos e mentiras dos que estão a sua volta, quer dizer que "eles" sussurram coisas para ela.
E quando a solidão e o silêncio se abraçam calorosamente, ela sabe que está em desvantagem, "eles" rondam a casa furiosamente e tentam alcançá-la insistentemente. E a garota se desespera por sentir que algo ruim vigia cada passo seu, mas ver "eles" é algo que só mortais especiais conseguem mas ela também é especial, de um jeito diferente.
Ela ouve, vozes trazidas pelo vento e pela quietude, todas as inúmeras tardes sozinhas, "eles" chamam seu nome. Às vezes calma e ternamente porém quando "eles" gritam seu nome, o próprio céu parece compartilhar a raiva que "eles" sentem da garota não responder seu chamado.
Entretanto ouvir seu nome é muito melhor do que ouvir: "Escreva!". Durante longos e longos dias, ela ouvia "Escreva!" e parecia que nunca ia parar e isso estava a enlouquecendo. Desde o amanhecer até o entardecer era só o que sussurravam em seus ouvidos, e mesmo que cada molécula do deu corpo se negasse a seguir aquela ordem, ela finalmente entendeu o que "eles" queriam.
E ela escreveu, escreveu todos os dias, por horas, acordava no meio da noite e suas mãos pareciam ter vontade própria, seus dedos não soltavam mais o lápis e mesmo que lutasse só conseguia se ver livre quando "eles" terminavam de contar suas histórias de morte, caos e destruição. Ela não tinha para quem contar o que acontecia, não podia pedir ajudava, ela estava sozinha e só ela poderia se salvar.
Então ela escreveu, escreveu e escreveu por um bom tempo porém algo mudava, lentamente, ela rejeitava o que não era do seu agrado, se recusava a ser acordada para escrever, se recusava a interromper coisas importantes para escrever. Não era mais a ordem que controlava ela, e sim ela controlava a ordem porém eles sussurravam "Escreva!" incessantemente e por fim ela disse "Não!". E ela não escreveu mais nada.